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Entrevista: "Só a tecnologia reduz custos e agiliza os processos"

Publicado: Quarta, 11 de Julho de 2007, 15h46

11.07.2007

 

O secretário-geral do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), juiz federal Sérgio Tejada, costuma dizer que a Justiça brasileira é uma das mais informatizadas do mundo, mas que o modelo tradicionalmente utilizado não conseguiu eliminar as enormes pilhas de papel que se acumulam nos tribunais. Segundo ele, apenas com a virtualização dos processos será possível garantir a rapidez e a segurança que a sociedade espera do Poder Judiciário. Consolidar essa modernização – e acabar com a morosidade das ações – é uma das principais bandeiras do Conselho Nacional de Justiça na gestão da ministra Ellen Gracie Northfleet, presidente do órgão e também do Supremo Tribunal Federal. Nesta entrevista exclusiva à Tema, Sérgio Tejada avalia o atual cenário de informatização do Judiciário, e fala sobre as perspectivas de melhora para os próximos anos.De que maneira a tecnologia da informação tem sido utilizada, historicamente, pela Justiça brasileira?Sou bastante crítico em relação ao modelo atual. A Justiça, de um modo geral, talvez seja a instituição mais informatizada entre os órgãos públicos brasileiros. Mas é uma informatização, até certo ponto, pouco inteligente. O que nós fizemos, ao longo da história, foi informatizar a burocracia, porque a maneira de processar e julgar as causas continua do mesmo modo como sempre foi. Muito formal, com processos ainda cheios de certidões, ainda utilizando papel, furando folhinhas, colocando dentro da pasta e tudo o mais. E uma vez feito isso e manipulada toda essa quantidade de papel, recorre-se a um sistema de primeiro mundo, informatizado; e registra-se num computador o que antes foi feito lá no modelo tradicional. Ou seja, a Justiça recebe uma petição inicial do advogado, leva ao juiz, o juiz ordena o “junte-se”, aquilo é colocado dentro do processo, e somente depois disso vai sistematizar. Nós nunca unimos essa duas coisas, transformando num sistema único, eletrônico.E o que está sendo feito para resolver essa situação, acabar com esse modelo “híbrido”?O que está se fazendo agora é justamente a informatização do processo. Informatização da Justiça, e não mais do Judiciário. É fazer uma vez só. Usar a TI na prestação jurisdicional mesmo, o que não é novidade. Embora a Justiça no Brasil seja, nesse aspecto, pioneira no mundo, porque os outros países ainda estão engatinhando nisso enquanto nós estamos muito avançados, internamente no Brasil o Poder Judiciário está atrasado. Se pegarmos, por exemplo, a rede bancária, ela não usa mais fichas para controles de saldos em conta corrente e saques em conta. E ninguém ousa imaginar o retorno do tempo em que, para saber o saldo, ou para sacar um dinheiro, era preciso ir ao banco, preencher uma ficha. Não se volta mais a esse tempo. Mas quando se trata de Justiça, muitos operadores dizem ainda que não dá, que é muito avançado, que os advogados e usuários não vão conseguir usar esse sistema moderno. Nessas horas, me vêm à mente os segurados da Previdência Social. Muitas vezes, uma viúva que nunca saía de casa, logo após a morte do marido vai ao INSS pedir uma pensão, e recebe um cartãozinho. No outro dia, ela está lá no banco, ou no caixa eletrônico de um supermercado, tirando o dinheirinho dela com o seu cartão. Usa a tecnologia de um dia para o outro. Então por que os advogados não vão conseguir usar o processo virtual?Qual a estratégia para enfrentar resistências e convencer os juízes e advogados de que a virtualização dos processos é o melhor para a Justiça?O convencimento acontece quando nós mostramos os benefícios, os resultados no combate à morosidade. A informatização do processo automatiza a maioria dos atos burocráticos. O processo torna-se essencialmente tempo útil, tempo nobre. Acaba a perda de tempo com burocracia. Com isso, é possível, inclusive, deslocar servidores que são da atividade burocrática para a atividade fim. Valoriza o trabalho do Judiciário e dá mais apoio para que o juiz cuide das ações em si. Esta é a grande vantagem: o combate à morosidade, que é o grande problema da Justiça hoje, uma coisa sistêmica. E isso não vale apenas para a Justiça. Quando falamos em processo, no Brasil, estamos falando em algo normalmente lento, em razão desses formalismos que nós ainda não conseguimos superar no País. Outro dia alguém comentava que nós usamos, no Brasil, um modelo processual que não deu certo no primeiro mundo, na Itália, na Alemanha, em Portugal, e aplicamos aqui exatamente o que não deu certo lá. Está na hora de mudar isso.A entrada em vigor da Lei 11.419, em março deste ano, contribui para esse esforço de convencimento?Sem dúvida que é mais um grande argumento de convencimento. Ela oficializa a virtualização dos processos. Porque um argumento que sempre ouvíamos dos mais resistentes, quando não tinham mais argumentos, era de que não havia lei que regulamentasse esse modelo. Quando todos os argumentos falecem, perguntavam sobre a lei. Mas agora existe uma lei. É importante, porém, lembrar que, mesmo sem a vigência da lei, 80% dos juizados federais já estão informatizados. Falo de informatização do processo, não da burocracia. Hoje, 60% dos novos processos que entram na Justiça Federal já são virtuais. Não há mais papel nessas causas. Quanto aos estaduais, já estamos trabalhando com 20 tribunais que até o final do primeiro semestre vão estar com, pelo menos, um piloto. Cinco ou seis Estados já instalaram pilotos, e nosso projeto é, até a metade do ano, completar esse cenário.Há estatísticas sobre o tempo que a Justiça gasta com a burocracia dos papéis?Um levantamento feito pela ministra Ellen Gracie Northfleet, aqui no Supremo Tribunal Federal, constatou que 70% do tempo gasto no processo é em burocracia, ou seja, indo ao sistema cadastrar as partes, registrar movimentações, anotar que o advogado levou o processo em carga, anotar que o advogado trouxe o processo de volta, fazer cartinha de intimação, fazer mandado para o oficial de Justiça. Isso é 70% do tempo do processo, que a ministra Ellen chamou de tempo neutro. Quando, na verdade, a finalidade do processo é dar a prestação de Justiça que a pessoa precisa. Então, só 30% é o tempo em que os operadores estão efetivamente voltados à prestação de Justiça.Mas ao longo dos últimos anos já vinham sendo feitos vários esforços no sentido de informatizar a Justiça. Quais os resultados obtidos na prática?Eu gosto de dizer que, com tudo o que se fez até hoje em termos de reformas processuais e até de informatização, conseguimos, pelo menos, empatar com o crescimento da demanda. Porque a Justiça vem, a cada ano, ampliando o número de processos. A partir da Constituição de 1988, com novas formas de ação, com o cidadão sabendo mais sobre os seus direitos, ele tem ido mais à Justiça. Reivindica mais. Isso é progressivo. Então o que nós conseguimos foi mais ou menos empatar o jogo, deixar a Justiça funcionando, não emperrada totalmente. Estamos com um estoque de processos que se mantém relativamente o mesmo já há alguns anos. O que não conseguimos ainda foi diminuir esse número, dar a volta. A informatização é o que vai reverter esse quadro.Em que medida a virtualização dos processos contribui para a transparência da Justiça?Hoje em dia, no modelo tradicional em papel, um processo fica escondido, no canto da mesa do juiz ou dentro de um armário. Ninguém sabe o que está acontecendo. E as coisas ainda são lentas. O juiz dá uma sentença, alguém vai lá e coloca a sentença dentro. O advogado entra com uma petição, e alguém insere aquilo também no processo. E só depois vai lá no sistema registrar. Acaba que as coisas ainda ficam muito escondidas. Mas se tivermos o processo informatizado, disponível na Internet, ele anda em tempo real. É o processo virtual. Porque não tem outro lugar para entregar uma petição e depois juntar. Ele pode ser consultado a qualquer momento, deixa de estar escondido lá no armário do juiz. Se uma parte (ou o juiz) quer saber como está o processo, basta acessar a Internet e consultar.O que significa essa virtualização em termos de economia?A economia é muito grande. Sob qualquer aspecto que olharmos só há economia. Um exemplo, que não é o que eu costumava dar, mas é muito importante: no ano passado, aqui no Supremo Tribunal Federal, tramitaram 680 toneladas de papel em recurso extraordinário. São processos enormes, coisa de 100 mil deles, que vieram dos mais diversos pontos do território nacional para serem julgados. Vieram e voltaram para seus Estados de origem. Na verdade são papéis que vieram só passear em Brasília. Aqui no Supremo só são examinadas matérias jurídicas de Direito Constitucional. E o grande volume que existe nesse processo é matéria de prova, é sobre audiência, testemunha. Daquele bolo de papel, pouquíssimas peças são examinadas. Imagine o desperdício de recursos para transportar essa papelada para lá e para cá.O senhor afirmou que o modelo de fluxo do processo virtual é semelhante ao do Siscomex (Sistema Integrado de Comércio Exterior), desenvolvido pelo Serpro para o Governo Federal. Qual a comparação que faz entre os dois projetos?O processo virtual funciona de modo muito parecido com o Siscomex. A idéia de que todos os operadores possam interagir, com o registro da operação sendo iniciado pelo despachante aduaneiro, diretamente no sistema, o auditor entrando e examinando, fazendo a liberação no sistema, sem gerar nenhum papel. São vários agentes, todos operando, interagindo de maneira virtual. Isso foi um exemplo seguido por nós, uma vez que oferece rapidez e segurança, pois as informações são todas informatizadas.Qual sua avaliação sobre o sistema de Escrituração Fiscal e Defesa Virtual (EFDV), desenvolvido pelo Serpro para a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional?Esse sistema valoriza todos os operadores da Justiça. No modelo tradicional, o advogado prepara uma petição inicial de um processo, junta cópias dos documentos, procurações, vai lá no balcão da Justiça, entrega e se livra do problema. Passa o problema para a Justiça, que pega aquele negócio, cadastra e tal. Com a execução fiscal é a mesma coisa. A PGFN larga uma inicial com a certidão de dívida ativa (CDA) no nosso balcão, e nós cadastramos e andamos com o processo. Não raro, o procurador da Fazenda não enxerga nunca mais aquele processo. Até porque a execução fiscal é dos mais numerosos e lentos processos que nós temos na Justiça. Mas com o novo sistema virtual, a Procuradoria remete eletronicamente, já fica a parte cadastrada, já fica a CDA inicial eletrônica nos autos, e o processo já está andando, o juiz recebe o processo pronto. Toda aquela fase de cadastrar, de distribuir, de furar, de botar grampinho, produzir etiqueta, tudo isso some. O processo sai da Procuradoria diretamente para a mesa do juiz. E o advogado acompanha virtualmente também, pela Internet.Que outros projetos o senhor destacaria como contribuição do Serpro ao Poder Judiciário?O Serpro é nosso parceiro. Estamos com a AC-Jus (Autoridade Certificadora da Justiça) hospedada lá. Temos também o Renajud, um projeto no qual o Serpro está trabalhando juntamente conosco e com o Ministério da Justiça, e que vai possibilitar aos juízes realizar a penhora on line de veículos. Toda a parte tecnológica do projeto está sendo feita no Serpro. Outro projeto é o InfoJud, que é o sistema pelo qual os juízes acessam a Receita Federal para verificar informações sobre os contribuintes. Esse projeto está em piloto no Paraná e no Distrito Federal. Na verdade, o Serpro não é um parceiro pequeno para o Judiciário. Existe muita coisa sendo feita em conjunto.Qual sua avaliação a respeito da AC-Jus, hospedada no Serpro?Eu sou um defensor árduo da certificação digital; tanto é que criamos a AC-Jus, que está lá no Serpro, no Rio de Janeiro. Foi uma iniciativa pioneira, a primeira Autoridade Certificadora de um poder judiciário no mundo. Portanto, não tenho nenhuma restrição quanto ao conceito da AC-Jus. Só acho que, neste momento, é preciso existir uma alternativa à certificação digital para os operadores poderem acessar o processo eletrônico. A questão é que são 600 mil advogados no Brasil, e a certificação digital não está popularizada ainda. E ainda existem vários municípios no Brasil em que a certificação digital vai levar alguns anos para chegar. Mas lá nós temos Justiça, e precisamos virtualizar a Justiça lá também. Então nós precisamos ter alternativa à certificação digital como fator de segurança na virtualização dos processos.Que alternativa o senhor sugere?Uma delas poderia ser os velhos login e senha, os mesmos utilizados pelos bancos até hoje. Isso seria uma forma de popularizar o processo eletrônico. Temos de vender facilidades, para cativar o nosso público; depois vamos colocando essas coisas. E a própria MP 2.200 faculta que se faça uma espécie de certificação privada entre as partes. Portanto a Justiça pode fazer isso com o advogado, diretamente. Evidente que temos de caminhar para a certificação digital, que é o ideal.De qualquer modo, a segurança da informação é sempre uma prioridade da Justiça, não?Claro, segurança é uma grande preocupação. E ainda que nós não tenhamos certificação digital, e mesmo que não tivéssemos login e senha, mas uma outra forma, assim mesmo o processo virtual é milhões de vezes mais seguro do que o papel, em todos os aspectos. O papel, o advogado leva para o escritório dele, manda o estagiário buscar aquele monte de coisas; na volta ninguém olha se alguém alterou algo ali dentro, se a peça que foi é a mesma que está voltando, se não falta uma coisa dentro. Agora, no meio eletrônico, tem rastro. Se houver qualquer alteração nós iremos saber. E podemos auditar e ir atrás. Agora, quem é que vai auditar um papel que sumiu – se só descobrimos anos depois que ele sumiu? Então, ainda que não tenhamos uma segurança absoluta, ela é muito maior no sistema eletrônico, que guarda um banco de dados, armazena. Hoje, com os meios modernos, dá para falsificar qualquer coisa no mundo físico. É possível pegar uma sentença do juiz, de dentro de um processo, scannear, alterar o que quiser, devolver ao processo e ninguém vai nem notar.Esse tipo de ocorrência é uma coisa freqüente na Justiça?Não, evidente que os problemas desse tipo são mínimos se nós considerarmos os volumes envolvidos. São mais de 40 milhões de processos no Brasil, e esse tipo de problema é estatisticamente insignificante. Isso nesse meio físico, que se tornou tão frágil no mundo de hoje. Se nós transportarmos isso para o meio virtual, que é muito mais seguro, então as ocorrências diminuirão ainda mais. Claro que o ideal é irmos caminhando para a certificação digital; estamos trabalhando nisso com a AC-Jus, todo dia estamos correndo atrás disso, mas vamos primeiro universalizar o acesso, que já é uma realidade melhor do que temos hoje.Já é possível observar resultados positivos a partir da instalação do Conselho Nacional de Justiça, ocorrida em 2006?Os números vão começar a aparecer dentro de algum tempo. Inclusive estamos moldando nosso sistema de estatística aqui, para poder mensurar isso. Mas o Conselho veio para ser um órgão, além de controle, de planejamento estratégico e de execução das grandes políticas do Poder Judiciário como um todo. E a ministra Ellen, em sua administração, elegeu a informática, principalmente, e mais do que isso, o combate à morosidade da Justiça, como plataforma principal da sua gestão. Ela imagina que, num prazo de dois a cinco anos, estaremos com a Justiça toda virtualizada. Aliás, toda não, pois quanto à estadual nós temos algumas ilhas de tecnologia bem avançadas, e outros locais que enfrentam dificuldades sérias quanto à informatização. Há também tribunais que são bastante avançados tecnologicamente, como o de São Paulo, mas em razão do volume de processos não consegue deslanchar. A idéia da presidente Ellen é fazer um up-grade em todos esses tribunais, principalmente nos estaduais. Em 2006 o Conselho investiu quase R$ 10 milhões de recursos próprios em compras de equipamentos, suportes e serviços, para ajudar especialmente os tribunais estaduais, que têm muitas dificuldades orçamentárias.Que mensagem o senhor enviaria aos cidadãos brasileiros, que aguardam ansiosamente pelo fim da morosidade na Justiça?O foco de todo esse trabalho é o cidadão. Porque a morosidade atinge diretamente a sua vida, o seu dia-a-dia. Precisamos entender que a Justiça é um serviço público, que o cidadão vem buscar, mas passa anos esperando para poder levar. Então o nosso objetivo é conseguir ter um processo rápido, permitindo que as pessoas obtenham a resposta da Justiça em tempo adequado, tenham mais acesso, que possam ter a Justiça de portas abertas por mais tempo, com mais transparência. Tudo isso em prol da cidadania. De nada adianta investir em tecnologia e modernização, se nós continuarmos prestando um serviço público de má qualidade. E isso, na média, infelizmente ainda é a realidade. Se eu tiver de mandar um recado para o cidadão, este recado é: “Comece a ter esperança!”. Porque o CNJ está empenhado nessa missão institucional de liderar o Poder Judiciário do País para melhorar nossa Justiça. A Justiça vai ser diferente depois que a ministra Ellen Gracie Northfleet concluir o seu mandato aqui.

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